quinta-feira, 21 de agosto de 2008

O Trem das 20:20


Chego à Central do Brasil , alguns degraus ,acima de minha cabeça (bem acima) está o monumento que reflete o tempo ( O relógio da Central), subo apressada , com olhares atentos à buscar o painel eletrônico, aquele que diz o horário de partida de cada trem. Ao fita-lo, meu coração acalmou-se, o trem daria partida as 20:20 , olhei pro meu relógio de pulso que gosto de usar no braço esquerdo e pude ver que ainda faltavam 20 minutos. Me direcionei a bilheteria, lá chegando deparei-me com uma pequena fila, mas observei que tinha um guichê vazio, não precisei nem me perguntar se estava funcionando, havia uma placa escrito ABERTO, fui direto nele e não quis saber o motivo do “abandono”, do outro lado do balcão e do vidro que separa vendedor de comprador, tinha um senhor caucasiano, de cabelos grisalhos, e uniforme , uma blusa pólo verde com azul, havia uma caneta presa dentro do bolso, no balcão uma máquina conectada ao serviço telefônico, uma dessas máquinas que usamos para passar cartões de créditos, ali era utilizada para recarregar os cartões de passagem super-via, nosso bilhete eletrônico; uma quantidade enorme de moedas e notas. Entreguei-lhe alguns trocados que logo se juntariam aquele montante e recebi como “prêmio” minha passagem de volta pra casa, essa transação não demorou nem dois minutos. Dei ênfase a este pequeno ocorrido , pelo simples fato de que sempre, mesmo sem pretensão, me deparo com aquele senhor quando vou comprar meu bilhete, acho que ele já me reconhece, pois sempre olha nos meus olhos com aquela expressão de “ Eu conheço você garota!”.
Recebi meu bilhete e fui atravessar a catraca, depositei o cartão e logo apareceu a palavra “ Passe”, me senti uma cadela, como se estivesse sendo inconviniente aos donos, enfiei o rabo entre as pernas e passei, né? Me deparei novamente com o painel eletrônico, ainda faltavam 18 minutos e eles nem anunciaram qual seria a plataforma, andei um pouco pra frente e parei ao lado da banca de jornal, ali observei um senhor bem vestido, com um livro na mão ( não pude ler o titulo do livro pois ele dobrou o livro no meio), meus olhos caçavam o que observar por pelo menos alguns minutinhos, continuei a olhar na direção do senhor, ao lado dele estava parada uma garota, aparentemente mais nova do que eu, com uma mochila rosa nas costas, cabelo longo e preso, olhar assustado o dela, mas o que meus olhos procuravam não estava nela, mas no que estava logo atras, a banca de jornal, ali estavam várias revistas , uma me chamou atenção, falava sobre Hitler, nazismo, guerra,essas coisas, mas só pude ler o enunciado, pois só mostravam ali a capa. A menina acompanhou o meu olhar e virou-se pra ler o que eu observava ( devo ter expressões fortes no olhar, geralmente as pessoas me acompanham buscando o motivo da atenção).
Enfim, desviei novamente o olhar, pois não tinha mais o que se ler, voltei-me para o placar eletrônico e logo piscou em negrito a plataforma e a linha de embarque, quase que no mesmo instante as pessoas se propuseram a correr, como se estivessem buscando um prêmio, eu pensei ( Querem correr? Então corram, mas não esbarrem em mim e nem me dêem truncadas!), fui andando pra plataforma 11, linha K . Sabe a menina de olhares assustados? Agora pareciam apavorados, ela , também, não correu, nem aquele senhor culto, bem vestido. Fomos andando , os três, mais parecíamos fazer uma fila indiana, ele na frente, depois a menina e por fim eu. Mas, eles andavam muito devagar, e minha estatura não me permite andar tão lento assim, seria capaz de tropeçar nas minhas próprias pernas, passei por eles e pra trás deixei mais dois personagens sem nomes. Andei bastante , até chegar próximo a cabine do maquinista, escolhi o segundo vagão e sentei-me à esquerda, ao lado da lixeira vazia, no canto do enorme banco. Logo o vagão foi enchendo e já não haviam mais lugares pra sentar quando de repente ouço o locutor da super-via dizer o seguinte : “ Trem com destino a Japeri não dará partida na plataforma 8 linha G, este , dará partida na plataforma 11 linha K” Pra que o homem foi anuncia isso?Como se essa fosse a primeira vez que eles anunciam algo errado, não?Agora geral vai correr pra cá, merda!

Enfim, as caixas erraram no primeiro anúncio , o que obrigou várias pessoas a praticarem uma corrida de obstáculos, obstáculos esses que mais pareciam covas de onde se levantavam os zumbis da central do Brasil, aqueles mortos-vivos de cansaço que circulam no trem das 20:20. O prêmio dessa corrida era um lugar ao céu, deleitariam-se em descanso os primeiros a atravessar as covas de trilhos. Muita gente foi premiada, muitas outras estão pagando até agora por não ter se esforçado mais e eu, sou sortuda, já estava no céu sem ter precisado passar pelas covas. Apesar de estar acomodada, sentada e confortável, não consigo gozar o prazer que a empreitada me proporcionou. Sabe por que? Bom, tem um indivíduo , magro, alto , caucasiano, vestindo jeans e uma camisa de malha de algodão cinza, este ser está me observando desde que chegou e eu não gosto de ser observada, não com tanta fixação! Aposto que ele está agora se perguntando o que é que eu tanto escrevo. Não importa, já faz tempo que aprendi a prazerosa arte de ignorar, usemo-as agora! Se ele quer saber, me incomodou e tirou minha concentração, droga!

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